terça-feira, 30 de novembro de 2021

O POSICIONAMENTO DO CREMESP SOBRE A UTILIZAÇÃO DA TELEMEDICINA PELO MÉDICO DO TRABALHO

Recentemente fiz uma consulta no CREMESP sobre o entendimento do referido conselho sobre a utilização de telemedicina pelos médicos do trabalho.

 Isso porque a nova Resolução CFM nº 2297/21, que dispõe de normas específicas para médicos que atendem o trabalhador, em seu artigo 6º, inciso I (que não constava na Resolução anterior), veda expressamente ao “médico que presta assistência ao trabalhador” “realizar exame médico ocupacional com recursos de telemedicina, sem o exame presencial do trabalhado”.

Ocorre que a Lei nº 13.989/20[1] autoriza o uso da telemedicina enquanto durar a crise ocasionada pelo coronavírus. Desde então a telemedicina vem sendo aplicada em diversos ramos da medicina. Sabemos que, quando necessária a presença do paciente para a realização de exames clínicos, ou por outro motivo que requeira investigação presencial, o atendimento deve ser realizado de forma presencial, e não por meio de telemedicina.

Mas e quando o médico do trabalho realiza a primeira consulta de forma presencial e faz todos os exames clínicos e procedimentos cuja presença se faz necessária, como ficam eventuais consultas de retorno e outras em que não seja necessária a presença física do paciente?

Pode o médico do trabalho realizar tais consultas por meio de telemedicina enquanto perdurar a pandemia de covid, conforme disposto na Lei nº 13.989/20?

A resposta do CREMESP (Consulta nº 175.624/2.021) foi a seguinte:

(...) Entendemos que exceto os exames periódicos em empresas de risco I e II, que podem configurar telemonitoramento, nos casos de home-office, todos os demais exames ganham contornos de consultas médicas primárias, exigindo-se a avaliação completa com todas as fases que compõem o exame ocupacional, portanto não podem ser realizadas por “teleconsulta”.

Desta maneira, de acordo com a Lei nº 13.989/20, o Ofício CFM nº. 1.756/20 e Portaria do Ministério da Saúde, entendemos que os exames ocupacionais na modalidade de exames periódicos, para trabalhadores em home-office, são passíveis de serem realizadas por telemonitoramento, frisamos que não se trata de telemedicina ou teleconsulta.”

Vale ressaltar as definições sobre telemedicina trazidas no Ofício CFM nº. 1.756/20[2]:

- Teleorientação: para que profissionais da medicina realizem à distância a orientação e o encaminhamento de pacientes em isolamento.

- Telemonitoramento: ato realizado sob orientação e supervisão médica para monitoramento ou vigência à distância de parâmetros de saúde e/ou doença.

- Teleinterconsulta: exclusivamente para troca de informações e opiniões entre médicos, para auxílio diagnostico ou terapêutico.

segunda-feira, 22 de novembro de 2021

A RESPONSABILIDADE DOS HOSPITAIS PSIQUIÁTRICOS

Dando prosseguimento ao estudo sobre responsabilidade civil em psiquiatria, passaremos agora para a responsabilidade dos hospitais psiquiátricos.

Um tema recorrente no judiciário diz respeito ao dever de guarda ou vigilância desses hospitais para com o paciente psiquiátrico internado, especialmente pelo seu estado de vulnerabilidade e fragilidade.

Miguel Kfouri Neto ressalta que em situações nas quais o paciente age de forma totalmente imprevisível, o evento danoso poderá ser caracterizado como infelicitas facti. Porém, o contrário também é verdadeiro: quando as precauções esperadas não são tomadas, poderá ocorrer responsabilização dos profissionais e das instituições[1].

Nos casos de fuga do hospital ou da clínica psiquiátrica, partindo da premissa da responsabilidade objetiva do hospital, esta, a princípio, representa uma falha no serviço prestado em decorrência da inobservância do dever de guarda e vigilância, seja em estabelecimento particular, no qual se aplica as regras do Código de Defesa do Consumidor, seja em estabelecimento público, no qual se aplica a responsabilidade objetiva prevista no artigo 37, § 6º da Constituição Federal[2] (veja que não se trata de responsabilidade do hospital em decorrência de erro médico, o que poderia ensejar a responsabilidade objetiva “derivada”, mas sim de responsabilidade que decorre diretamente da estrutura hospitalar, tratando-se, pois, de responsabilidade objetiva “pura”).

Logo, para se eximir do dever de indenizar, deve o hospital demonstrar não ter ocorrido qualquer falha na prestação do serviço, e que o evento ocorreu por culpa exclusiva da vítima ou de terceiros, ou seja, que há alguma excludente do nexo causal.

O mesmo raciocínio se aplica aos casos de conduta lesiva do paciente psiquiátrico contra terceiros durante o tratamento e/ou a internação do paciente em hospital e nos casos de morte, conforme julgados dos Tribunais pátrios. Há decisões no sentido de que o defeito do serviço se consubstancia na falha de segurança, vigilância e assistência à pessoa em estado de extrema vulnerabilidade, que estava sob sua tutela.


[1] Responsabilidade Civil dos Hospitais. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019, p. 172.

quinta-feira, 11 de novembro de 2021

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL NA PSIQUIATRIA

  A Lei nº 10.216/2001, conhecida como “Lei da reforma psiquiátrica” trouxe um novo modelo de assistência psiquiátrica no pais, conferindo maior proteção a esses cidadãos vulneráveis, superando o ultrapassado conceito de manicômio, privilegiando um tratamento humanitário e antidiscriminatório.

Dentre outras mudanças, esta Lei estabeleceu a internação psiquiátrica como exceção, somente indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes, impondo a obrigação de que a internação psiquiátrica seja realizada mediante laudo médico.

Uma das grandes dificuldades na área da psiquiatria é a elaboração de um diagnóstico preciso em casos mais complexos. Sua importância é salutar, pois é através dele que o médico analisa e emite parecer sobre a doença que acomete o paciente e a sua gravidade, servindo como primeiro passo para estabelecer um prognóstico, fornecer orientações ao paciente e planejar o tratamento mais adequado ao caso apresentado[1].

Mas, infelizmente, mesmo com todos os avanços tecnológicos pelos quais a medicina vem passando, não há um modo preciso e totalmente eficaz de emitir um diagnóstico de doença mental, que seja universalmente aceito.

Por tal motivo, o erro de diagnóstico na área psiquiátrica é, a princípio, escusável, com exceção dos erros grosseiros. É Importante valorar também as circunstâncias de cada caso concreto, como o estado de saúde em que o paciente se encontrava, suas vicissitudes, complicações existentes, riscos a que estava exposto, entre outros. Nesse sentido, leciona Miguel Kfouri Neto:

Mesmo reconhecida a diversidade de métodos e técnicas cientificamente recomendados – e ainda que saibamos quão difícil é, entre os vários métodos de eficácia comprovada, escolher o melhor –, o paciente psiquiátrico tem direito à melhor terapia, mais adequada ao seu caso específico. Surge, então, a possibilidade do erro de diagnóstico. Também na psiquiatria o erro de diagnóstico, em princípio, é escusável. O médico não se obriga a acertar 100% dos diagnósticos. Todavia, esses erros tornam-se particularmente mais graves quando o médico lança mão de diagnósticos padronizados – e errôneos – sem aprofundada anamnese ou exames complementares. Aí poderão ocorrer internações indevidas, interdições desnecessárias, e o médico se expõe à demanda de reparação de danos. O psiquiatra deve se ater às circunstâncias do caso, estado do paciente, contexto terapêutico”.[2]

Além disso, deve-se ressaltar que a obrigação a obrigação assumida pelo médico é de meio, e não de resultado, de modo que a obrigação contratual do profissional não é propriamente curar, mas, sim, dispensar ao seu paciente cuidados conscienciosos e atentos de acordo com as aquisições da ciência.

Outro ponto que deve ser observado é que pode ocorrer de uma mesma patologia poder ser tratada de diversas formas, o que dificulta a análise de eventual culpa médica por erro de tratamento na psiquiatria, pois a valoração de cada opção disponível difere de um profissional para o outro



[1] COSTALES, J. Fernandez. Responsabilidad Civil Médica y Hospitalaria. Madrid: Edilex, 1987

[2] KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil dos Médicos. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019, p. 371.

ENTREVISTA CONCEDIDAAO JORNAL CORREIO DE SALVADOR

  P - Quais são as demandas mais comuns dos clientes que buscam mover ações judiciais, de acordo com sua experiência?   R – As demandas e...